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terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Malcriado


O amor acontece.
Ah! E como ele acontece atrevido
Quando não espera a hora,
Sua hora é a que quer e pronto,
E nada mais adianta.
Esse amor é mesmo um danado.
Um malcriado que
Bate o pé no chão,
Não. Ele não vai embora.
O amor acontece a qualquer hora,
Em lugares ermos,
Em pistas de corrida,
Comendo pizza,
Dormindo à tarde.
O amor se intromete,
Promete mundos e fundos
E cumpre bem pouco,
Mas faz um estrago.
E desse estrago as mulheres gostam
E os homens também.
O amor faz milagres,
Maltrata mas faz milagres.
Corta unha, faz cafuné,
Faz comidinha, coça o pé.
O amor é uma delícia
E faz falta quando inventa de ir embora.
Só volta quando quer,
A hora ele mesmo escolhe

E nada mais adianta.

Jane Santos

Por conveniência


Pergunto-lhe como vão as coisas
No dia a dia de suas coisas,
No decorrer da sua correria,
E encontro escondida
Uma lágrima já morta
No seu semblante pálido,
Face mórbida, sorriso insosso.
Casas caídas moram no seu olhar.
Mas você disfarça
Entre tentativas infelizes
De decretar felicidade.
Você se perde,
Pois que ingênua demais.
E pergunto-lhe dos filhos,
Das flores, das datas comemoradas.
E como sei que dói,
Faço isso de cruel.
Sei que não há filhos
Estes que se importem
Com sua solidão.
As flores assombram sua janela
E as datas passaram despercebidas,
Sem velinhas ou rá-tim-buns.
Mas você insiste
Em me fazer crer
Que o insosso do riso é só aparência.
Mas me disseram um dia que as aparências enganam.

Jane Santos

Tempos de pequena


Saudade sinto mesmo
De quando eu podia brincar,
Correr no terreiro lá de casa,
A casa de meus avós.
Casa de taipa,
Barroca caindo no chão,
Teto bem baixo,
Mas que ainda acho
Ter sido o melhor casarão.
Naquele tempo não tinha poste,
Mas a lua clareava bem
As noites de contos
De assombração.
Era um monte de gente
Ao redor da montanha de feijão.
Debulha e fala.
Debulha e ri.
Debulha e chora.
Era uma parola só,
Numa diversão única,
Porque não se via outra.
Mas eu tenho saudades ainda assim.
Da comida da vovó,
Das fugidas com os primos,
Das casinhas sem móveis
Debaixo das moitinhas.
A gente caçava joaninha em tempos de chuva,
E corria todo o lugarejo
Debaixo de um toró.
Correndo.
Pegava unha de gato,
Comia a florzinha da raposa,
Passava na casa mal-assombrada
E metia o pé na carreira.
Gostava até de pegar água na cacimba,
Longe...
Porque éramos pequenos.
Éramos donos do mundo.
Nesse tempo
Podia-se nada e se podia tudo.

Jane Santos

domingo, 28 de dezembro de 2014

Seria bom se fosse fácil


Seria bom se fosse fácil
Amar a um e a outro também.
Seria bom, sem desagrado
Se fosse fácil querer bem.
Seria leve, muito calmo
O amor que livre fosse
E se entregasse a um alguém.
Seria sincero, sem pecado
Se apenas aceitássemos as vontades
E não tolhêssemos a coragem,
E que simplesmente pudéssemos amar
De um jeito ou de outro,
Intensamente ou de passagem,
Para sempre ou paixão de viagem,
Apenas pelo prazer que dá.

Seria bom se fosse fácil,
Se nos permitíssemos sem errar.
Seria bom se fosse fácil
Amar a um e a outro também.
Seria bom, sem desagrado
Se fosse fácil querer bem.

Jane Santos

Negrada


Eu sou nêgo
Nêgo do Brasil inteiro

Que pulou cercas e fugiu do cativeiro.

Eu sou nêga
Nêga da nação inteira
Que dançou e rodou saia no terreiro.
Eu sou nêgo e não tem jeito
Eu sou e nêga e acho bom
Eu sou do sangue igual ao seu
Da natureza mesma que nos gerou.
Somos gente, você e eu
Só precisamos de mais amor.
Mais amor, mais amor
Mais amor, meu amor,
Por favor.

Jane Santos