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quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Filho


Filho amado, nascido da divindade,
Vem para minha vida
Trazer-me felicidade.
Vem com a luz que te ilumina
Iluminar nossa passagem,
Vem com o amor que te anima
Fazer-me amar com intensidade.
Do meu ventre tu és fruto,
Do meu peito a metade,
Da minha alma tu és tudo
E juro-te em verdade,
Que mãe boa eu serei,
Para ti dedicarei
O meu ser, minha lealdade.
Dar-te-ei educação de amor,
Ensinar-te-ei o caminho do bem,
Seguindo as palavras do Senhor,
Serás um trabalhador
E almas conquistarás também.

Façais, Senhor, do meu rebento uma glória,
Dai as dádivas necessárias
Para que sua história
Seja marcada pela mão amiga,
E que a espada e a palavra indigna
Não se apoderem de seu espírito,
Que seu ânimo de amor esteja sempre vivo,
A cada instante, a cada hora.

Meu papel de mãe protetora farei
Para que nosso lindo menino
Se crie e vá
Para todos os recantos falar,
Do perdão, da paz e da caridade.
Para que nosso menino siga
A palavra profunda que tu ensinas,
E ame tanto a mim quanto a seu pai,
E ame o mundo, os homens, os animais,
Falando manso e conhecendo
Os desígnios morais,
Os pormenores intelectuais,
As moradas do Pai,
Para continuar vivendo.

Jane Santos (inspirado)

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Escriba



Não me roubem as palavras,
Elas são um calço na existência.
Permitem eu ser importante, gigante,
Não me deixam morrer.
Não me tirem esse bem que me faz bem,
Que permite a poesia quando se menos espera,
Que deixam acontecer a festa no meu sobrado,
Que sobrou da rua no fim da cidade,
Ao lado de um bocado qualquer de casas.
Elas me trazem a paz que não se compra,
Elas são a minha pompa,
O que de melhor posso oferecer,
Com rimas, ou com besteiras a se dizer,
Só pra não cansar do todo-dia-toda-hora.
As palavras são a glória desse espírito infame
Que inventou de ser poeta
Num mundo que passa e segue,
E não vê e não se embebe
Como nós sonhamos no fundo.
Livros vendidos. Multidões de leitores.
Nome na mídia. Dinheiro no bolso.
Que tolos somos nós,
Poesia não dá salário,
Só afago no peito que quer se esvaziar...
Uma taça, por favor.

Jane Santos

Mamãe de primeira viagem

A barriga cresce... cresce.
Um rebento lindo me envelhece,
Porque agora serei mãe.
Momento inédito, forte,
Porque agora serei mãe.
Velhice gostosa... porque envelhecer faz bem,
Quer dizer vida,
Quer dizer o tempo que passa 
E acumula mágicas,
Que se amontoam todas em nossas mãos.
Vida que gera outra vida...
Que povoa a Terra ainda indecisa,
Mas que vem ávida por fazer.
E mamãe segurará a mão,
Mostrará o entardecer.
Não dirá o medo que a vida faz viver.
Não fará penúrias sobre os erros a acorrer.
Mamãe dará livros, tintas, lousas, lápis...
Mamãe dará.
O leite, o peito a sugar.
Mamãe já deu o corpo,
O coração já dá,
Já entregou a alma,
Já renegou o não
Quando se pensava em te gerar.
E minha barriga cresce.
Pés, mãos, pulmão, corpinho todo formado.
Vai pular no gramado, com cachorros e gatos.
Vai sorrir, nadar, correr e pedir comida.
Vai ser coisa linda de viver!!!
Vai ler Drummond, ouvir John...
Poetisar na estrada, na escada, na esquina.
Vai ser um rei.
Álvaro.
Amor da minha vida.

Jane Santos

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Criador




A matéria bruta sou eu,
Que ainda não sei as regras todas de português,
Que não sei
As regas de Deus.
A matéria pura é Ele,
Que materializou todo o universo,
No inverso das coisas fez o sentido,
No espírito das coisas fez a razão.
E não errou, e não erra nunca.
Apesar da minha ignorância,
Que o julgo a partir do meu chão,
Ele é maior, maior que as próprias palavras
E as essências que O procuram decifrar.
Maior que a ciência
Que em sua inocência o procura mostrar
Sem a magnificência, sem nada.

A matéria bruta sou eu...
Que ainda não consegui até Ele chegar.

Jane Santos

sexta-feira, 15 de julho de 2011

À escrita, meu amor de todo dia.

Meu costume de escrever
Vem  de longe,
Tempos remotos,
Bem distantes,
Homens passados e passantes,
Vem do meu pai, minha mãe,
Vem dos avós de minha amante.
Esse costume de inventar rimas,
Poesias solitárias a punho,
Vem dos sumérios e seu cunho,,
Que à escrita deram impulso,
Pulso de sobrevivência.
E apesar de parecer efêmera,
Poesia virou a palavra,
A palavra virou coisa,
Tatearam-na tempos a fio,
Materializaram verbos e provérbios,
Verdades e mentiras,
Homenagearam Clio.
Materializaram a vontade,
Casaram e descasaram,
Deixaram restos mortais
Em inventários.
Registraram novas almas,
Anotaram entradas e saídas,
Despesas e despedidas,
Amor e guerra,
A pau e pedra.
Libertaram e crucificaram,
Por vezes me mataram
Em nome de Deus.
Mas apesar de tudo,
Amadeus materializou a melodia,
Tão escorregadia que é,
Prendeu-na à partitura,
E que beleza como se comporta,
Desnuda nas linhas,
Em notas de rodapé,
A palavra e a música
Qual em curvas de mulher.
É o presente de Thoth ou de Apolo,
Que desce do tempo
E cobre meus olhos,
Rápidos e famintos
Ao ler os livros
Dos Apóstolos,
Ou a carta de Caminha.
Tanto fez, tanto faz,
Mas viva a escrita.
Viva a poesia.

Jane Santos

sábado, 9 de julho de 2011

Teoria e Prática

Coragem, criatura...
Une tuas ferramentas e vai,
Une tuas preces e corre,
Segue em busca do teu intento.
Não se impressione demais com os outros,
Os outros não sabem nada de ti,
Acham que sabem e escrevem, e falam,
Fazem homenagens ou te esculacham,
Mas não sabem, e isso os atormenta.
De pé, criatura,
Deixa de coisa,
A coisa mesmo que merece tua insônia
É o amor,
É o amor inteiro e sem fronteiras,
São os amores das línguas estrangeiras,
É o amor e suas traduções, significações, reticências.
Deixa dessa lamúria insuportável,
Queixas desnecessárias,
Sendo que o mundo está um caos,
Vai lá e dá teu viva,
E viva a vida, viva a taça,
Viva o livro, viva a graça,
Viva o amigo, viva a praça
Que recebe as devassas ou as matronas,
E os palhaços pra fazer rir.
Não titubeies com as críticas,
Que seja a carne fraca,
Mas que seja a mente firme.
Levanta-te, homem de nenhuma fé,
E vai pro mundo viver,
Vai para o mundo viver,
Que é a tua mão que ele agarra,
Homem,
Homem de raças,
Filho da terra que empobrece,
Pega tuas preces
E vai fazer.

Jane Santos

A chorosa do amor


É na calada da noite que calo meus reclames,
E tem um calo no meu pé, calo infame,
Que perturba a forma mais doce de fazer amor,
Este amor que negas, tão dono de si,
Meio piegas,
Brincando de fugir,
Pega não pega, seja o que seja, chega o desistir.
É na passagem faceira do tempo que olho o tempo
E vixe, Maria! Vai chover.
Vai chover minhas lágrimas porque você nunca vem,
Vai chover canivete se tem outra mulher. E tem.
E andei tanto pra comprar um livro,
Dar-te de presente, segunda mão,
Que importa?
Estive em tua porta
Que não me foi aberta.
Do armário catei uns mimos,
Umas frases envelhecidas,
Uns olhares amarelados,
E fui toda abestalhada
Treinando as falas,
Materializando o momento,
E que tormento! Que desastre sem fim!
Tive que jogar tudo na primeira lixeira,
Na volta, a revolta das mãos vazias,
Nem um beijo, nem uma lembrança,
Com cara de criança,
Chorei.
E é nesse pensar inquieto aqui nesta cadeira de plástico
Que tento rasgar nossos retratos...
Retratos falsos de sentimentos falsos,
Sorrisos amargos,
Vidas mentirosas num flesh que se apagou,
Pra sempre se apagou.
De olho inchado, cara de besta,
Vou sair nessa sexta e buscar outro amor.

Jane Santos

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Deus Sol



Sou filha do deus Sol,
E do deus sol eu me alimento,
Plantas que crio,
Animais que planto,
Filhos que mimo, pessoas e desencantos.
Todos linhagem do deus da luz
Que nasce todo dia na minha janela envidraçada.
Há um imenso quê de prazer em compartilhar dessa fertilidade,
Mulheres disputando homens, homens disputando cargos,
Flores querendo os raios,
E eu rindo de tudo isso.
Pelo cheiro se conhece a intenção,
E o sol, imenso, terrivelmente lindo,
Consegue pôr começo, meio e fim nos nossos riscos,
De dia é melhor... é menos perigo,
À noite que cai, é melhor não ir por certas ruas...
Pode ser que lá haja bandidos, monstros, medusas,
E que terrível seria virar uma pedra, o sol esquentar
E você irremediavelmente não poder fugir pra debaixo de uma árvore fria.
A luz que vem de cima, vem pelos lados e nos firma
Nesse mundo que tem o tempo matematicamente dividido,
Seguindo a vontade do sol.
É ele que nos aviva.
Acorda, João, vai pro trabalho,
Acorda, Maria, olha as crianças,
Acorda, menino, vai pra escola,
Acordo pessoal, vai viver o tempo.
Dorme pessoal, vai descansar o tempo vivido,
Porque agora eu sou do oriente, e eles me reclamam no íntimo.

Sou filha do deus Sol que me dá o bronze e tudo mais de que necessito.

Jane Santos

sábado, 2 de julho de 2011

Entre um muro e outro




Corações inteiros andam pelas esquinas da cidade grande,
Tão grande que meus passos se perpetuam
Ruas avante,
E o olhar se embaralha com tanta propaganda.
O brilho opaco do céu poderia ser o astro do dia,
Faz chuva, faz sol
E o que importa, se ninguém nota?
Eu vou então recortando o imenso das calçadas,
Avenidas alargadas,
Cidades modernas que não vi surgi,
Mas vejo-as crescendo tão rápido, tão rápido, tão rápido
E me perdi!
Os carros correram muito e tentei olhar as pessoas neles.
Se o poeta fosse vivo, além de dentro de mim,
Diria então que as pessoas hoje são pedras no caminho.
Há uma pessoa no meio do caminho,
Sai da frente que vou passar.
Olha o meio... eita! Que esbarro.
E foi pensando nesses pormenores tão menores
Diante das importâncias do mundo,
Que costurei idéias para lhe contar.
Cá entre nós, tá dando saudade do meu mundo pequeno lá do interior.
Eu sei, não precisa dizer,
O interior tá se alargando e se aglutinando com os limites das grandes cidades.
Lá tem tudo que aqui tem....
Mas lá eu conheço as pessoas.
Muito bem, eu sei e não precisa falar...
Ninguém  conhece as pessoas,
Mas lá ainda posso andar a pé.
E a preguiça deixa?
As distâncias cresceram na nossa mente.
Bom, então... gosto de lá não por ser interior, mas por ser meu mundo quase pacato,
Uma cidadezinha arruinada no fracasso político,
Desesperada por dinheiro,
Cheia de intrigas... mas tão bonita.
Lá não sinto tanto os gases no ar.
E aqui, nesse vai e vem de desconhecidos,
De lugares muito muito longe,
Eu sufoco e correr não é a solução,
Pois os carros me atropelam, não esperam,
E eu morro sem voltar.
Há um morto...
Há um morto no meio do caminho.

Jane Santos

terça-feira, 17 de maio de 2011

Poema do amor desconsertado

Não tenho poder político
Capaz de mudar o mundo,
Não tenho poder de guerra
Capaz de fazer converções,
Não tenho nehum poder, aliás,
Senão aquele de te amar.
Aquele de mostrar por A mais B mais C e o alfabeto todo
Que todo meu conhecimento,
Minha vivência,
Minha burrice, minha lerdeza,
É pra você.
E um pouco mais do meu perfume,
Do meu corpo,
Do meu costume insuportável de escrever.
O meu poder é esse que você não nota,
Não anota nada, nem datas
Nem recados na geladeira.
Você não percebe por ser cotidiano,
Aquele do amor na quarta-feira,
Do beijo de até logo,
A briga inexplicável do caminho,
Você guardando os óculos....
É esse poder que tenho e você tem,
Meu bem, não me esqueça,
Não me deixe, não me desmereça.
São os pedidos dos olhares
Os quais as palavras preferem calar,
E só mostra por meio de enigmas
O amor que não nos irrita,
Porque não é doce nem amargo nem azedo nem salgado,
É o equilíbrio dos poderes dos dois lados,
Você e eu na intolência e nos afagos
Do dia que vai,
Do dia que vem,
Dos anos que se contam
No nosso conto sem final feliz,
Porque amor assim, final não tem.

Jane Santos

Sentido pouco



Concordo que a poesia de hoje me arrepiou,
Concordo que andar na esteira da academia,
Olhando para sua ida e vinda
Não me apagou a lembrança,
Nem a música do Legião Urbana,
Nem a briga do cachorro com o gato,
Nem o noticiário,
Nem mesmo você,
Que me faz relembrar as palavras profundas,
As danças do amor que o poeta declarou,
Que desfilou para mim sua eternidade.
Concordo com minha pequenez
Enquanto essa embriaguez louca
De derivar do poeta.
Que loucura essa...
Quem pode entender.
Mas por não ter outro caminho,
Sigo este, sozinho,
Prestando homenagem às quedas,
Às flores e às pedras,
Prestigiando o que está,
O que morre, o que é infindo,
Morrendo de amor por dentro
Amor de textos que fazem pouco sentido.

Jane Santos

Os tolos das idéias divergentes




Todo tolo tem razão
Quando esta não é avaliada.
Todo tolo vai à morte
Se necessário for
Pra defender a tolice,
Que é seu amor.
Ele a declara pública,
Ele a declara correta,
Religião absurda,
Às vezes indiscreta,
Que desafia a história,
Que desafia poetas,
Que não sabe aonde vai,
Mas chega e se diz real.
Vejo tolos por toda parte,
Embutidos em corpos fortes,
Vejo tolos em qualquer parte,
Vejo tolos em mim mesma,
Que os carrejo feito imã,
E os revejo no espelho.
Não adianta discutir,
A razão desarrazoada é firme,
Não respeita limites,
É intolerante.
E eu fico na espreita,
Observando os levantes.
Vozes ecoam de lá,
Verdades e mentiras se delatam.
Todos tolos no mesmo palco,
Duelando quem mais argumenta,
Vence quem mais pensa,
Aquele que sabe e entende
Que brigar por idéias radicais é insuficiente
Para mudar a mentalidade.
Esta é do tempo, da educação paciente,
Esta é do tempo, da busca pertinente.

Jane Santos

Grandes pequenos fios



A cor que eu gosto
É o ocre que se expressa
Nas pinturas e nos liames
Da humanidade.
É aquela cor característica
De um filme de época,
Da pele de Eva,
Adão a pensar.
A cor que gosto é a cor de outrora
Nas páginas da história
Que eu gosto de contar.
O preto e branco das fotografias
Das pessoas antigas,
Encantadoras de um lugar.
É a ferrugem do trem
Seu poder que ainda tem,
Por entre as matas já cortadas
Mundo afora.
Vou contar uma canção
Que o tempo não ignora,
É o canto das línguas,
É o rugir das páginas,
Das músicas urbanas,
São as cores e o som da palavra,
Das sociedades humanas.
Quero dizer que amo,
Quero dizer que busco,
Num viver confuso,
Onde o passado vale pouco,
Compreender e guardar,
Guardar e repassar
Os sentidos dos esboços quase perfeitos,
Construídos por persas, romanos e gregos,
De diversas civilizações,
Que são as nossas razões
Daquilo que somos hoje.
Então recebo das mãos de Deus
A missão de levar aos seus
Um pouco dessa história
De letras, imagens e memórias,
De povos, lugares e enfins.
Porque a cor que eu gosto é do marfim,
Aquele dos pobres elefantes,
Que levaram economias avante,
Que fizeram o escambo e seus filhos,
Porque a cor que eu gosto é o marrom,
Aquele das pinturas rupestres,
O vermelho dos índios sem vestes,
O verde das matas dos bárbaros,
Dos caçadores medievais,
O verde morada dos pássaros.
A cor que eu gosto é o branco
Das roupas simples das criadas,
Dos vestidos asseados das escravas,
Das ricas roupagens das senhoras.
O branco da Boa Nova,
Anunciada por Jesus.
Porque a cor que eu gosto é o preto
Estampado nos rostos das viúvas,
Solitárias depois das guerras
Que deprimem o ser humano.
O preto do negro escravo ou liberto,
Nas favelas do Rio ou nos guetos,
O preto bem preto dos meus sapatos,
Que percorrem os caminhos dos carros,
Que passam e voltam
E esquecem que também são fatos
Pra eu contar.

Jane Santos

terça-feira, 19 de abril de 2011

Pobre diabo


A poesia triste é a que vende;
Pois o público quer chorar,
A dona quer o ombro do amor,
E ele quer uma oportunidade para a conquista.
A poesia trágica é a que fica,
A história faz questão de relembrar,
Os críticos elegem como profunda;
A posteridade se apega a ela e diz que é sua,
Tão bela a poesia que faz chorar.
E é por isso e por outros tantos motivos,
Que escrevo tão triste assim,
No desejo de tocar alguém,
Alguma alma perdida nesse mundo além e infindo.
É por isso que me esforço para não apagar essa tristeza
E mostrar aqui toda sua beleza,
Aproveitar o que não tem jeito mais.
Fui criança um dia e rimei palavrinhas,
Cresci e rimo tristezas
De um poeta que morre afagando flores apáticas.
Um dia triste me fez este poema,
Que por acaso alguém vai ler e rir,
E nada do meu esforço terá valido a pena,
Pois de que adiantam lágrimas para quem não está triste?
Triste sou eu, pobre diabo,
Que se perdeu nos versos de um poeta trágico,
Mas que nem assim vendeu nem ficou na história,
Que já não se aguenta mais de tanto fato.

Jane Santos

terça-feira, 5 de abril de 2011

Um dia, no bosque



Um dia, no bosque, colhi flores azuis
Para pousar nas tuas nuas mãos,
Para alegrar teus olhos grandes e negros,
Para ganhar tua simpatia e roubar um beijo.
Um dia, sozinho no caminho seco
Eu desenhei no chão teu nome,
E, poeta atordoado, não soube e nem pude
Dali em diante saber o meu sem ti.
E fui destrambelhadamente conquistando os pássaros,
Reunindo numa sacola suas cantigas doces e fugidias,
Tentei prendê-las pra ti,
Fazendo uma caixinha de música natural.
A memória desse amor me perseguiu por anos,
E sem poder nem querer esquecer esse fato,
Fui escrevendo versos, prosas e relatos
Sobre uma menina que vi sentada à beira do rio,
Andando no bosque,
Escostada ao poste,
Correndo para longe de mim.
E como posso, poeta que insisto ser,
Esquecer os olhos, os dedos com as flores
E a boca sem nenhum susurro?
É tortura viver anos com a lembrança
Do não realizado,
Morrerei apaixonado,
Carregando aquele beijo que só eu dei para o túmulo.

Jane Santos

domingo, 3 de abril de 2011

Em tempos de separação



Eu nem notei a sua chegada,
Seu perfume você deixou em outros lugares
E eu nem senti sua presença.
Também não senti o processo de mudança da alma,
Não percebi o quanto eu te amava,
O quanto doía fundo a insensibilidade
De quando se sabe a verdade,
De quando não se é mais única.
Nem notei a diferença do seu sapato camurça,
Presente em uma data qualquer...
Não percebi-me mais mulher,
Não sei mais os segredos da conquista,
Nem das pernas que despistam a todos em correr.
Esqueci de como se fala
Quando se está enamorada,
É o mal do costume de uma vida casada,
É o mal de ter-me feito um pedaço de ti
E ter-te visto o inteiro de mim.
A dor da despedida nunca senti,
E agora me depedaço toda em lamúrias,
Em saudades e loucuras,
Em querer rever teus olhos, sentir o cheiro de
Perfume suado,
Em te ver voltar cansado do trabalho,
Em te ver recair sobre o meu colo,
Pedindo, suplicante, um pouco de amor.
É essa dor, essa desventura,
Que me arranca da paz dessa penumbra
E me põe a correr o olhar e porcurar-te na esquina,
A falar com alguma vizinha,
A contar anedotas políticas
Ou simplesmente de que não suporta sem mim.

Jane Santos